ANUNCIE AQUI!
Crédito, Gabinete do Xerife do Condado de Mesa
Há 18 minutos
Caroline falou pela primeira vez sobre sua prisão, por meio de uma nota pública divulgada pelo TheDream.US, organização sem fins lucrativos dedicada a oferecer bolsas de estudos para jovens imigrantes, através da qual a brasileira estuda enfermagem como bolsista na Universidade de Utah.
Ela foi solta sob fiança na sexta-feira (20/6), mais de 36 horas após a Justiça americana decidir pela soltura, em audiência realizada na quarta-feira anterior.
A estudante vive nos Estados Unidos desde os 7 anos. A família dela entrou no país com um visto turístico de seis meses, mas ficou além deste prazo.
Há três anos, a família entrou com um pedido de asilo e ainda aguarda uma decisão — não estão claros os motivos alegados para o pedido.
Em sua primeira declaração pública, Caroline se queixou da qualidade da comida no centro de detenção privado do ICE em Aurora, no Colorado, onde esteve detida por mais de duas semanas.
"Na detenção, nos davam comida encharcada – até o pão vinha molhado", disse a brasileira.
A jovem também relatou uma diferença de tratamento entre os imigrantes presos que falam inglês e aqueles que não falam.
"No momento em que perceberam que eu falava inglês, notei uma mudança. De repente, fui tratada melhor do que outras pessoas que não falavam inglês", disse Caroline.
"Isso partiu meu coração. Porque ninguém merece ser tratado assim. Não em um país que chamo de lar desde os 7 anos de idade e que é tudo o que eu conheço."
Crédito, Arquivo pessoal
A BBC News Brasil procurou o ICE para responder às críticas feitas por Caroline.
Por email, a secretária adjunta de Assuntos Públicos do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (DHS, na sigla em inglês), Tricia McLaughlin, desqualificou as declarações da brasileira. O ICE é subordinado ao DHS.
"Qualquer alegação de que indivíduos são tratados de forma diferente pelas autoridades por causa do idioma que falam é categoricamente FALSA. Esse tipo de ataque tem como objetivo demonizar e vilanizar nossos corajosos agentes do ICE. Esse tipo de lixo resultou em um aumento de mais de 500% nos ataques contra agentes da lei", declarou McLaughlin.
"Os fatos são: Caroline Dias Gonçalves, uma imigrante ilegal do Brasil, foi presa pelo ICE em 5 de junho de 2025. Seu visto expirou há mais de uma década. O presidente Trump e a secretária [Kristi] Noem [do DHS] estão comprometidos em restaurar a integridade do programa de vistos e garantir que ele não seja abusado como um passe-livre para estrangeiros permanecerem nos EUA."
A secretária adjunta disse ainda que o ICE é regularmente auditado e inspecionado por agências externas para garantir que todas as suas instalações estejam em conformidade com os padrões nacionais de detenção.
A BBC News Brasil encaminhou a resposta de McLaughlin ao advogado de Caroline, Jonathan M. Hyman, para comentário.
"A linguagem usada pela secretária adjunta é puramente política e retórica vazia", disse Hyman, também por email.
"Ninguém apoia agressões contra agentes da lei. Embora as alegações sobre o aumento desses ataques devam ser verificadas, encorajo a secretária adjunta e seu departamento a serem honestos e transparentes."
"Estou ciente do aumento do uso de câmeras corporais por policiais estaduais. Talvez os agentes do ICE devessem usar mais câmeras no corpo e menos máscaras", completou o advogado — os agentes do ICE vêm sendo criticados nos EUA por trabalharem mascarados ao realizar operações para detenção de imigrantes.
Crédito, Reuters
'Espero que mais ninguém tenha que passar pelo que passei'
Em sua nota pública, a estudante brasileira agradeceu a seus amigos e familiares pela mobilização em favor de sua libertação. E disse desculpar o agente do ICE que a prendeu.
"Ele pediu desculpas e dizia que queria me soltar, mas que suas 'mãos estavam atadas'. Não havia nada que ele pudesse fazer, mesmo sabendo que aquilo era errado", disse Caroline.
"Quero que você saiba — eu te perdoo. Porque acredito que as pessoas podem fazer escolhas melhores quando têm essa opção."
Caroline também disse esperar que outros não passem pelo que ela passou.
"Espero que mais ninguém tenha que passar pelo que eu passei. Mas sei que, neste momento, mais de 1.300 pessoas ainda vivem o mesmo pesadelo naquela unidade de detenção em Aurora. Elas são como eu — incluindo outras pessoas que cresceram aqui, que amam este país e que querem apenas uma chance de pertencer", disse a brasileira.
"Imigrantes como eu — não estamos pedindo nada de especial. Apenas uma chance justa de ajustar nosso status [imigratório], de nos sentirmos seguros e de continuar construindo as vidas pelas quais tanto lutamos neste país que chamamos de lar."
A prisão de Caroline ocorreu em meio ao endurecimento da política de imigração nos Estados Unidos que tem marcado o segundo mandato de Donald Trump.
Cerca de 51 mil imigrantes sem documentação estavam detidos pelo ICE no início de junho — maior número já registrado desde setembro de 2019.
Inicialmente, as autoridades americanas insistiam que as operações do ICE eram direcionadas a criminosos e potenciais ameaças à segurança pública.
Mas um número significativo de imigrantes detidos pelo governo Trump não tem antecedentes criminais, como é o caso de Caroline.
Após a prisão da brasileira, os amigos da estudante realizaram uma coleta de doações para ajudar a família a arcar com os custos da defesa dela.
Com a libertação da jovem, a campanha de financiamento continua, agora com objetivo de coletar recursos para a defesa contra uma possível deportação.
Relembre o caso
Caroline Dias Gonçalves foi presa pelo serviço de imigração dos EUA em 5 de junho, enquanto dirigia do Utah, onde mora e estuda, ao estado vizinho do Colorado, onde planejava visitar amigos.
Nesse trajeto, ela foi parada por um policial, posteriormente identificado como Alexander Zwinck, que disse que a estudante estava dirigindo próxima demais a um caminhão. Esse policial deixou Carolina ir apenas com um aviso.
Minutos depois desta primeira abordagem, ela foi novamente parada, agora por um agente do ICE.
Caroline foi então detida, passando mais de duas semanas presa num centro federal para detenção de imigrantes em Aurora, nas proximidades de Denver, capital do Colorado.
Imagens da câmara corporal utilizada pelo agente Zwinck foram depois publicadas pelo Gabinete do Xerife do Condado de Mesa, como parte de uma investigação em andamento sobre o caso.
Elas mostram o policial perguntando a Caroline sobre seu local de nascimento. Mas, de acordo com a legislação do Colorado, a polícia não pode investigar o status de residência das pessoas abordadas em nenhuma interação policial.
Crédito, Gabinete do Xerife do Condado de Mesa
Segundo o Gabinete do Xerife do Condado de Mesa, a prisão de Caroline teria acontecido após informações sobre ela serem compartilhadas por Zwinck em um grupo no aplicativo de troca de mensagens Signal usado por forças policiais para o combate ao tráfico de drogas.
"Não tínhamos conhecimento de que o grupo de comunicação estava sendo utilizado para qualquer finalidade além do combate ao tráfico de drogas, incluindo questões imigratórias. Desde então, removemos todos os membros do Gabinete do Xerife do Condado de Mesa desse grupo de comunicação", informou o Gabinete do Xerife em 16 de junho.
Em 19 de junho, em novo comunicado, o gabinete informou que Zwinck foi colocado em licença administrativa enquanto a polícia local continua a investigar as circunstâncias que levaram à detenção da brasileira.
O advogado de Caroline, Jonathan M. Hyman, comentou a atuação de Zwinck, em sua resposta a questionamento da BBC News Brasil:
"As informações que o policial tinha em mãos antes de interrogar minha cliente ainda são desconhecidas. No entanto, suas perguntas foram reveladoras. Minha cliente não tem sotaque, e mesmo assim ele perguntou de onde ela era. Essa informação não era relevante para a abordagem de trânsito. Questionar as motivações de um agente da lei não significa demonizá-lo ou vilanizá-lo."
Comentários
Aproveite ao máximo as notícias fazendo login
Entrar Registro