
Crédito, Arquivo pessoal
- Author, Redação*
- Role, BBC News Mundo
Há 22 minutos
Tempo de leitura: 8 min
"Dinheiro não cai do céu."
Existe no mundo hoje um grupo pequeno, mas em expansão, que contesta essa expressão popular: os caçadores de meteoritos, pessoas que percorrem o planeta em busca de pedras vindas do espaço.
Além do evidente interesse científico, surgiu nos últimos anos um mercado lucrativo em torno das rochas extraterrestres.
A disposição de colecionadores particulares em pagar bastante dinheiro por um pedaço de material espacial tem atraído pessoas como Roberto Vargas, um americano filho de porto-riquenhos, que em 2021 largou o emprego para se dedicar à busca de meteoritos ao redor do mundo.
"Assim que algo cai, é hora de sair a campo", disse Vargas ao The Documentary Podcast, do Serviço Mundial da BBC.
A curiosidade que mudou sua vida
A trajetória de Vargas como caçador de meteoritos começou por curiosidade.
"Por algum motivo, eu achava que uma pessoa comum não podia possuir meteoritos. Então, quando segurei um nas mãos, fiquei extremamente empolgado", explicou. A partir daí, ele passou a colecioná-los.
No entanto, em 2019, ao saber que um meteorito havia caído na Costa Rica, decidiu ir atrás dele.
"Não consegui encontrar, mas consegui comprar muitos", contou.

Crédito, Oguzhan Demir/Anadolu via Getty Images
Então, ele decidiu colocá-los à venda para bancar parte da aventura, e o resultado superou todas as suas expectativas.
"Na primeira viagem à Costa Rica, voltei numa sexta-feira e, na segunda, já tinha vendido meteoritos e ganhado mais de US$ 40.000 (cerca de R$ 200 mil). Então, foi uma experiência que mudou a minha vida", afirmou.
Alguns anos depois, Vargas deixou o emprego como terapeuta na área de saúde mental, no qual ganhava entre US$ 50.000 e US$ 60.000 por ano (aproximadamente entre R$ 250 mil e R$ 300 mil), para se dedicar exclusivamente a rastrear rochas espaciais que chegam à Terra.
Criando um novo mercado
Mas o trabalho complexo de encontrar fragmentos de rochas vindas do espaço não faria sentido sem pessoas como Darryl Pitt, fotógrafo musical que se tornou comerciante de meteoritos.
"Eu estava no Newport Folk Festival e alguém me disse: 'Vamos a um show de rock'. Eu não sabia que era literalmente um show de pedras (rock, em inglês), de gemas e minerais; achei que fosse algo musical", contou Pitt, que se interessou por rochas espaciais ainda na infância, quando viu a cratera deixada por um meteorito que caiu no Arizona (EUA) há milhares de anos.
"Fomos ao evento e havia um sujeito vendendo um pedaço de meteorito da cratera do Arizona, o mesmo lugar que visitei quando criança. Eu comprei, e foi assim que tudo começou", relatou.
"Eu queria compartilhar minha fascinação com o mundo, mas também queria ganhar dinheiro. E percebi que o mais importante era apresentá-los ao mundo dos leilões", acrescentou.
Na década de 1990, ele organizou o primeiro leilão de meteoritos. Desde então, os preços só aumentaram, em grande parte devido ao crescente número de colecionadores.

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Por que o interesse nesses fragmentos de rocha? E como se define seu valor? Antes de responder a essas perguntas, vale esclarecer o que exatamente está sendo vendido.
"Um meteorito é uma rocha que chegou à superfície da Terra", explicou a professora Sarah Russell, do Museu de História Natural de Londres (Reino Unido), à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC).
A especialista lembrou que, antes disso, enquanto cruzam a atmosfera como "bolas de fogo brilhantes", essas rochas são chamadas de meteoros.
"Um meteorito (...) pode vir de qualquer lugar. Acreditamos que a maioria venha de asteroides, mas alguns vêm da Lua, outros de Marte, e há ainda aqueles cuja origem desconhecemos. Mas todos são rochas do espaço", afirmou Russell.
Fatores como o tamanho da rocha, se é um fragmento inteiro, se colidiu com algum objeto artificial, a raridade de sua composição, sua classificação e sua procedência influenciam na definição do valor.
"É possível comprar um meteorito por apenas 20 ou 30 centavos de dólar o grama" (cerca de R$ 1 a R$ 1,50), afirmou Pitt, que alertou, no entanto, para a existência de muitas falsificações em sites como o eBay.
Por peças incomuns, no entanto, podem ser pagos milhões de dólares. Foi o caso de um meteorito marciano de 24 quilos, vendido por US$ 4,3 milhões (cerca de R$ 21,5 milhões) pela casa de leilões Sotheby's, em Nova York (Estados Unidos), em julho passado.
Mas como distinguir um meteorito de uma rocha comum?
"Quando um meteorito atravessa a atmosfera, sua parte externa derrete e forma uma fina crosta milimétrica chamada crosta de fusão, que é muito singular", explicou Russell.
Além disso, segundo a especialista, eles também podem ser mais pesados do que uma rocha terrestre. Ainda assim, é necessário testá-las para determinar sua composição química.
Existem três tipos de meteoritos: de pedra, metálicos (de ferro) ou uma combinação dos dois, detalhou Russell.

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Um comércio em xeque
O caso do meteorito vendido em Nova York gerou um debate sobre esse tipo de transação.
A rocha foi encontrada no Níger (África Ocidental) em novembro de 2023 por um caçador anônimo. Depois que a venda veio a público, autoridades do país africano e acadêmicos passaram a questionar a legalidade da transação.
"Precisamos aguardar as orientações dadas aos diferentes ministérios para esclarecer esse assunto e saber como o meteorito saiu do país, quem o retirou e se sua extração foi autorizada. Quem concedeu a autorização? Só quando tivermos todos esses detalhes poderemos fazer um julgamento", disse o professor Idi Umuru Amadou, diretor do Departamento de Arqueologia da Universidade Abdu Mouni (Níger), à BBC News Mundo.
O Níger não possui uma legislação específica sobre objetos extraterrestres, mas conta com normas relativas a minerais e bens patrimoniais.
"Normalmente, objetos como esse, bens culturais que deixam o país, precisam estar acompanhados de uma autorização administrativa, dependendo da região a que pertencem. É preciso solicitá-la e, uma vez concedida, o objeto pode sair legalmente do país. Caso contrário, configura roubo ou saque", alertou o especialista.
O leilão do meteorito marciano encontrado no Níger e a controvérsia que se seguiu chamaram atenção para a comercialização de rochas espaciais e para a questão de quem é seu proprietário quando elas caem na Terra.
As regras variam muito de um país para outro, reconheceu a professora Russell.
"Por exemplo, na Austrália não é permitida a exportação de meteoritos, e há leis e políticas muito rígidas, enquanto no Reino Unido não existem leis específicas sobre o tema", explicou.

Crédito, Getty Images
As outras caçadoras
Mas não existem apenas caçadores interessados em localizar meteoritos para vendê-los a colecionadores e ganhar dinheiro. Há também quem busque garantir que esses objetos cheguem a instituições científicas.
Um desses grupos está na América Latina e é formado por mulheres. São as Meteoríticas, uma organização de cientistas brasileiras que não hesitam em viajar para desertos, cidades ou florestas quando recebem informação sobre um impacto.
"Deixamos o que estamos fazendo e partimos em busca desse novo meteorito. Porque ser as primeiras faz diferença", disse a meteorologista Amanda Tosi, uma das integrantes das Meteoríticas, à BBC News Mundo.
A especialista não condena a comercialização das rochas espaciais, mas defende que ela seja regulamentada.
"Não queremos proibir a compra e a venda, porque quando há comércio em torno dos meteoritos, as pessoas se sentem estimuladas a procurá-los, e acabam encontrando exemplares importantes", argumentou.
"Se for proibido, teremos menos material para estudar. Mas precisamos de um equilíbrio para proteger o meteorito como patrimônio cultural e científico e garantir que haja amostras suficientes para pesquisa. É por isso que precisamos de uma lei", acrescentou.
No entanto, as normas nem sempre são suficientes. Um exemplo é a Argentina que, apesar de contar com legislação sobre o assunto, tem visto nos últimos anos seu vasto patrimônio de meteoritos se tornar alvo de contrabandistas.
Nesse país sul-americano fica o Campo del Cielo, um dos maiores campos de meteoritos do mundo, localizado a cerca de 1.000 quilômetros a noroeste de Buenos Aires (Capital da Argentina).

Crédito, CHARLY TRIBALLEAU/AFP via Getty Images
Russell se manifestou em termos semelhantes.
"Quando são encontradas amostras realmente únicas, elas podem nos abrir uma porta para uma parte do sistema solar que ainda não conseguimos explorar. E, se não tivermos a oportunidade de obter essa rocha, não poderemos aprender tanto sobre o espaço ao nosso redor, o que tem impacto, por exemplo, no planejamento de futuras missões espaciais e na indústria espacial como um todo", explicou.
"Diante do grande interesse por meteoritos também no setor privado, os preços disparam e, às vezes, fica mais difícil para museus e outras instituições científicas adquiri-los, especialmente os mais valiosos", acrescentou.
Vargas, por sua vez, defendeu seu trabalho e negou ser um pirata.
"Sim, temos motivação econômica, mas também científica. Queremos que essas rochas estejam nas mãos de cientistas, e que sejam protegidas, cuidadas e estudadas", afirmou.
*Esta versão escrita de The Documentary Podcast, do Serviço Mundial da BBC, foi redigida por Juan Francisco Alonso.
*Clique aqui para ouvir o programa em inglês.

Crédito, GUILLAUME SOUVANT/AFP via Getty Images

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