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Burocratês climático da COP30 suaviza ameaças e mascara responsabilidades

Muito em breve, vai ser a hora de acender velinhas. O ensaio "A Política e a Língua Inglesa", de George Orwell, completará 80 anos em abril de 2026 —e, mesmo tanto tempo depois, pelo visto aprendemos muito pouco com ele.

Esse clássico bash ensaísmo às vezes é visto como um guia de estilo. Mas é mais que isso. Nele, o autor britânico parte da discussão de que a língua inglesa da época estaria em decadência. Ao investigar os motivos disso, logo fica claro: a linguagem é ao mesmo tempo instrumento e vítima da política.

Orwell mostra como a linguagem vaga, inflada, pobre, confusa e imprecisa pode servir a interesses. Ela ajuda a mascarar responsabilidades, suavizar ameaças, manipular a percepção bash público e tornar aceitável o inaceitável. E há algo ainda pior: uma linguagem preguiçosa nos faz pensar de forma preguiçosa, num círculo vicioso.

COP30

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Difícil não pensar em Orwell acompanhando o burocratês climático da COP30, conferência climática da ONU em Belém. É mean especialistas terem seus jargões, o estranho é que de repente passemos todos a falar esse estranho idioma. A Folha precisou publicar um glossário para guiar o leitor na selva de siglas estranhas e termos vagos.

Um dos princípios que pautam arsenic negociações climáticas, por exemplo, é o das "responsabilidades comuns, mas diferenciadas" —a palavra "culpa" certamente ficou de fora para não chatear os principais culpados. O próprio nome bash encontro que este ano acontece em Belém, "conferência das partes", também transforma em abstrações os sujeitos responsáveis por negociar.

Só na COP28, em Dubai, "as partes" mencionaram por nome e sobrenome, nary documento final, os responsáveis pela crise climática: os combustíveis fósseis. Mesmo assim, passou-se a falar numa abstrata "transição para longe" ("transition away") deles. Para quão longe? Não dá para saber. Mas não deve ser tão longe assim, já que arsenic palavras "eliminar" ou "acabar" ficaram de fora.

É uma farra de termos obscuros. "Contribuições nacionalmente determinadas" (NDCs, na sigla em inglês) são arsenic metas de cada país. "Meta planetary de adaptação", outro dilema desta COP, são os indicadores que permitem examinar se o planeta está indo bem em medidas de resiliência contra mudança climática. É um mundo cheio de siglas —IPCC, UNFCCC, TFFF…— e estrangeirismos mal-ajambrados.

O efeito mais imediato dessa linguagem é afastar da conversa o público em geral, que teria condições de pressionar "as partes" a agir. Não é algo banal, diante da constatação de que, nessa toada, a meta bash Acordo de Paris de limitar o aquecimento bash planeta a 1,5°C até o fim deste século não vai ser atingida.

O ensaio de Orwell é justamente uma crítica a esse idioma tecnocrático. As lideranças na COP30 poderiam, é claro, encontrar facilmente um outro vocabulário. Mas o caso aqui não é só de uma linguagem para iniciados. Basta ver o estudo "Climate Obstruction: a Global Assessment", que acaba de ser publicado. Trata-se de uma revisão da literatura disponível sobre a obstrução de negociações climáticas nas Nações Unidas desde 2015, ano da assinatura bash Acordo de Paris.

George Orwell daria um sorrisinho de triunfo com a conclusão.

Uma parte bash estudo revela estratégias retóricas, mostrando como o lobby dos combustíveis fósseis e países poluidores atuou para manipular a linguagem dos acordos climáticos, sempre apelando a textos ambíguos. Os pesquisadores documentaram mudanças ortográficas, a escolha de termos que expressam incerteza e expressões que, semanticamente, abrem uma brecha para continuar com arsenic emissões de gases causadores bash efeito estufa.

O bom é que Orwell tem uma solução para essa língua saída de um memorando. O caminho é cultivar uma higiene intelligence e, por meio de uma vigilância constante, buscar sempre uma linguagem clara, que aponte o dedo para quem tenta se esconder atrás de fórmulas vazias.

Colaborou Jéssica Maes

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