4 meses atrás 54

Chats do ChatGPT abertos no Google revelam tropeço em nova era da internet

Sam Altman, CEO da OpenAI, dona do ChatGPT
Sam Altman, CEO da OpenAI, dona do ChatGPT Imagem: Justin Sullivan/Getty Images

(Esta é a newsletter Radar Big Tech. Inscreva-se gratuitamente para receber no seu email toda sexta. Conheça as demais newsletters do UOL. São dezenas de opções sobre os mais variados assuntos para a sua escolha)

Sim, o pesadelo de muita gente virou realidade. Conversas que as pessoas têm com o ChatGPT foram indexadas pelo Google. Isso permitiu a qualquer um com um celular ou computador —e alguma noção técnica— ver que Jair Bolsonaro foi citado pelo chat como exemplo de governador autoritário; saber que páginas do UOL foram citadas em papos a respeito de curiosidades da cultura japonesa e que alguém estava muito interessado em elaborar um ranking dos melhores batedores de pênalti da história do futebol.

Os exemplos acima são banais, mas Radar Big Tech detectou orientações do chat de como fabricar bombas com Napalm, bastante usado nas guerras da Coreia e do Vietnã. E é possível que dados confidenciais também viram a luz do dia, após terem sido compartilhados com o ChatGPT na ilusão de que ficariam em sigilo.

Desastrosa, a situação nasceu de uma função criada pela OpenAI, mas acionada pelo usuário. Ainda assim, a repercussão foi tão ruim que a empresa desabilitou a configuração. Problema resolvido? Em partes. O imbróglio mostra como a internet está mudando, o que Diego Ivo, CEO da Conversion, classifica como um caminho sem volta. Líder de uma das maiores agências de SEO (otimização para motores de busca) do Brasil, ele ajuda a jogar luzes na dinâmica -por vezes obscura- entre duas das principais participantes da corrida da inteligência artificial.

Imagem

Na semana passada, os mais aficionadas por tecnologia entrarão em pânico ao descobrir que:

  • Algumas conversas mantidas no ChatGPT iam parar no Google. Bastava...
  • ... Pesquisar por "site:chatgpt.com/share" seguido de uma palavra-chave ("marketing", "amor", "bomba"), e o motor de busca exibia vários chats que trouxessem o termo. A FastCompany chegou a contar mais de 70 mil. Não era qualquer papo, afinal...
  • ... Eram indexados pelo Google apenas os bate-papos voluntariamente liberados pelas pessoas ou aqueles cujos links públicos trafegavam em canais abertos da internet -os usuários usam esses links para compartilhar descobertas com conhecidos, mas obviamente sem a expectativa de vê-los à disposição de qualquer um no buscador mais famoso do mundo. Se serve de consolo...
  • ... O nome do interlocutor não era mencionado, ficava anônimo. Mesmo assim, não pegou bem. Tanto é que a OpenAI encerrou a função ainda na sexta (1º):

Esta foi uma experiência de curta duração para ajudar as pessoas a descobrir conversas úteis (...) No fim das contas, achamos que o recurso apresentava muitas oportunidades para as pessoas compartilharem acidentalmente coisas que não pretendiam, então estamos removendo essa opção. Também estamos trabalhando para remover o conteúdo indexado dos mecanismos de busca relevantes.
Dane Stuckey, diretor de segurança da informação da OpenAI

  • ... Como o seguro morreu de velho, os céticos com os esforços da OpenAI podem verificar por conta própria quais são seus chats tornados públicos (vá a "https://chat.openai.com/share"). Quem quiser fazer a reclamação diretamente no Google, o link é este aqui (https://search.google.com/search-console/remove-outdated-content). Ainda que tenha tido vida curta...
  • ... A função durou tempo suficiente para escancarar cantos obscuros da briga mais quente -e mais imprevisível- da internet. É a disputa entre a busca tradicional por informação, representada pelo Google, e aquela nascida da onda da IA generativa e realizada por meio de chatbots, simbolizada pelo ChatGPT.
Continua após a publicidade
Imagem

O episódio fornece algumas conclusões, como:

1) Não se engane: chatbots de IA dependem da busca online

Depois de as pessoas passarem a usar ChatGPT e similares como assistentes pessoais, o que inclui pesquisar informações online, muita gente decretou a morte do Google e outros motores de buscas.

No entanto, a lambança da semana passada tornou evidente algo embaraçoso para a OpenAI: a queridinha dos fãs de IA rifou a privacidade de seus usuários para tornar sua plataforma mais "visível" aos olhos do Google para elevá-la alguns links acima no ranking do Google, avalia Diego Ivo, da Conversion.

A OpenAI estava mandando essa informação pro Google, porque o Google só chega a esse chat a partir do momento que a Open consegue falar o que ele diz, porque a URL é completamente aleatória. Provavelmente alguém da OpenAI falou: 'vamos permitir que as conversas sejam indexadas, porque a gente vai ranquear mais Google e vai receber tráfego'. Consideraram isso daí uma estratégia inteligente e, em certo sentido, não deixa de ser
Diego Ivo

Continua após a publicidade

2) OpenAI não é inimiga do Google

Até há uma disputa pela hegemonia das buscas, mas ela encobre uma relação de dependência, já que os chatbots de IA recorrem aos motores de busca para vasculhar a internet.

Devido à parceria entre Microsoft e OpenAI, o Bing é oficialmente o motor de busca do ChatGPT. No entanto, pesquisadores têm reunido evidências de que o chatbot passou a usar o Google —algumas respostas, por exemplo, reproduzem padrões e formatações que só a empresa fornece. Fora isso, a OpenAI está de olho no desfecho do julgamento que pode forçar o Google a vender o Chrome. Os navegadores são os iniciadores de boa parte das buscas online, e o Chrome é o maior dos browser. Isso cairia como uma luva na estratégia da empresa de Sam Altman.

3) Surgem os truques para restaurar o tráfego perdido com a IA

Com os resumos feitos com IA, ChatGPT e Google resolvem a vida do usuário preguiçoso, que se contenta com a resposta ultraprocessada extraída de links garimpados na internet. Mas direcionam pouco —ou nenhum— tráfego aos sites que elaboraram o conteúdo tomado emprestado pelos robôs.

Para reverter a situação, um batalhão de gente se dedica a influenciar a dieta dos robôs de IA. Afinal, se for possível influenciar qual conteúdo é digerido, talvez dê para controlar o resultado regurgitado. No breve período em que as conversas do ChatGPT foram indexadas no Google, surgiu uma malandragem. Cantada por Przemek Cherklevich, CEO da startup Relock, consistia em: abrir conversas com o ChatGPT, manipular o robô para tecer comentários positivos a respeito de uma empresa e tornar os chats públicos. Replicar o máximo possível. Tudo para lustrar a reputação online da companhia. Funcionou? Difícil saber.

Continua após a publicidade

Em Deu Tilt, contei como pesquisadores já desenvolvem técnicas consistentes para manipular chatbots. Firmas de SEO, porém, levaram os testes a outro nível. Especialistas da Reboot, do Reino Unido, fizeram ChatGPT e Perplexity dizer que o CEO da companhia era o homem calvo mais sexy de 2025. Ou seja, convenceram os robôs a contar duas mentiras: que Jerry Colonna é calvo e sexy.

Imagem

Bom, talvez Colonna seja mesmo calvo. Além desta, a outra ponderação a ser feita é sobre a rapidez com que se sacramentam mortes no mundo online.

Gente séria já trata o Google como carta fora do baralho. Okay, a OpenAI é com certeza a mais séria ameaça ao império das buscas online. Mas ela é a desafiante, não a desafiada. Exibir as conversas com o ChatGPT na busca do Google, ainda que com a anuência dos usuários, mostra que a empresa ainda tropeça na hora de dar grandes saltos nessa disputa.

Outro sepultamento prematuro é o das técnicas para tornar conteúdos mais visíveis em mecanismos de buscas. Para Diego Ivo, a visão ignora o funcionamento dos chatbots de IA e não enxerga que o SEO vale para plataformas "off Google", como YouTube e TikTok.

Muitas pessoas têm falado que o GEO (otimização para motores generativos) matou o SEO. Não poderia estar mais errado. GEO é só mais uma forma de fazer SEO voltado para as IAs generativas. Não tem como uma subárea de uma coisa maior matar a própria área. É uma contradição em termos
Diego Ivo, CEO da Conversion

Continua após a publicidade

DEU TILT

Toda semana, Diogo Cortiz e Helton Simões Gomes conversam sobre as tecnologias que movimentam os humanos por trás das máquinas. O programa é publicado às terças-feiras no YouTube do UOL e nas plataformas de áudio. Assista ao episódio da semana completo.

TEVE TAMBÉM EM RADAR BIG TECH

Deu Tilt #1
Agente do ChatGPT: agora, ele promete até comprar por você Leia mais

Deu Tilt #2
Lição para o tarifaço? Como a Nvidia dobrou Trump e manteve elo com a China Leia mais

Continua após a publicidade

Deu Tilt #3
Pix, gov.br e mais: 5 tecnologias brasileiras para assustar os EUA Leia mais

Deu Tilt #4
Grok: após elogiar Hitler, IA de Musk vira nova arma do Exército dos EUA Leia mais

Navegadores
Opera reclama no Cade contra a Microsoft por práticas abusivas no Edge Leia mais

OpenAI
O ChatGPT está nos deixando estúpidos? Leia mais

Meta
Verificação do WhatsApp vira nova arma para convencer vítimas de golpe Leia mais

Smartphones
Por que celulares chineses 'invadem' o Brasil, mas vendas não decolam Leia mais

Leia o artigo inteiro

Do Twitter

Comentários

Aproveite ao máximo as notícias fazendo login
Entrar Registro