Crédito, Getty Images
- Author, Marcus Pearce
- Role, The Conversation*
Há 1 minuto
Muitos de nós adquirimos o hábito de escutar podcasts, áudios e outros conteúdos online em uma velocidade de reprodução mais rápida. Para os jovens, inclusive, isso é praticamente uma regra.
Uma pesquisa realizada com estudantes da Califórnia, por exemplo, revelou que 89% mudavam a velocidade de reprodução das aulas online, e já houve várias reportagens em diferentes veículos de comunicação sobre como assistir vídeos no "modo rápido" se tornou comum.
É fácil pensar nas vantagens de assistir as coisas rápido: consumir mais conteúdo em menos tempo, revisar o mesmo conteúdo várias vezes para absorver o máximo de informações.
Isso pode ser especialmente útil em um contexto educacional, liberando mais tempo para o aluno consolidar o conhecimento, fazer provas práticas etc.
Assistir vídeos no modo rápido também pode ser uma boa maneira de manter nossa atenção e interesse durante todo o vídeo, evitando que a mente se distraia.
Mas, e quanto às desvantagens?
Sobrecarga cognitiva
Quando uma pessoa é exposta a informações faladas, os pesquisadores distinguem três fases da memória: a codificação da informação, o armazenamento e, posteriormente, a recuperação.
Na fase de codificação, o cérebro precisa de certo tempo para processar e compreender o fluxo de palavras que recebe. É preciso extrair as palavras e recuperar seu significado contextual da memória em tempo real.
As pessoas geralmente falam a uma velocidade de cerca de 150 palavras por minuto, embora dobrar esse número para 300 ou triplicá-lo para 450 palavras por minuto ainda esteja dentro do que podemos considerar inteligível.
A questão está mais relacionada à qualidade e à durabilidade das lembranças que formamos.
As informações que recebemos são armazenadas temporariamente em um sistema de memória chamado memória de trabalho. Isso permite que fragmentos de informação sejam transformados, combinados e manipulados até atingir uma forma adequada para serem transferidos para a memória de longo prazo.
Considerando que nossa memória de trabalho tem uma capacidade limitada, se chega muita informação rápido demais, ela pode ficar sobrecarregada. Isso leva à sobrecarga cognitiva e à perda de informações.
Assistir no modo rápido e a recuperação de informações
Uma meta-análise recente examinou 24 estudos sobre a aprendizagem a partir de vídeos de palestras.
Os estudos variavam em seu desenho, mas, no geral, consistiam em reproduzir uma videoaula na velocidade normal (1x) para um grupo e reproduzir a mesma videoconferência em uma velocidade maior (1,25x, 1,5x, 2x e 2,5x) a outro grupo.
Assim como em um ensaio controlado utilizado para testar tratamentos médicos, os participantes foram distribuídos aleatoriamente para cada um dos dois grupos.
Em seguida, ambos os grupos realizaram uma prova idêntica depois de assistir um vídeo para avaliar seus conhecimentos sobre o material.
As provas consistiam em recordar informações, responder a perguntas de múltipla escolha para avaliar sua capacidade de memorização, ou ambas as coisas.
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A meta-análise mostrou que aumentar a velocidade de reprodução tinha efeitos cada vez mais negativos no desempenho da prova. Em velocidades de até 1,5x, o prejuízo era muito pequeno. Mas, a partir de 2x, o efeito negativo era de moderado a grande.
Dando um exemplo: se a pontuação média de um grupo fosse de 75%, com uma variação típica de 20 pontos percentuais par mais ou para menos, aumentar a velocidade de reprodução para 1,5x, reduziria o resultado médio de cada pessoa em dois pontos percentuais.
E aumentar a velocidade para 2,5x levaria a uma perda média de 17 pontos percentuais.
Pessoas mais velhas
Curiosamente, um dos estudos incluídos na meta-análise também investigou adultos mais velhos (de 61 a 94 anos) e descobriu que eles eram mais afetados por assistir a conteúdos em velocidades mais rápidas do que os adultos mais jovens (de 18 a 36 anos).
Isso pode refletir um enfraquecimento da capacidade de memória de pessoas saudáveis, o que sugere que adultos mais velhos devem assistir a conteúdos na velocidade normal ou até mesmo mais lentas para compensar.
Contudo, ainda não sabemos se é possível reduzir os efeitos negativos da reprodução rápida com a prática regular.
Portanto, pode ser que os adultos mais jovens simplesmente tenham mais experiência com a reprodução rápida e, por isso, lidem melhor com o aumento da carga cognitiva.
Da mesma forma, isso significa que não sabemos se as pessoas mais jovens podem mitigar os efeitos negativos sobre sua capacidade de reter informações usando velocidades mais rápidas com mais frequência.
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Outra incógnita é se existem efeitos de longo prazo sobre a função mental e a atividade cerebral decorrentes de assistir a vídeos em velocidades de reprodução mais aceleradas.
Em teoria, esses efeitos poderiam ser positivos, como uma melhor capacidade de lidar com uma carga cognitiva maior. Ou poderiam ser negativos, como um maior cansaço mental resultante do aumento da carga cognitiva. Mas ainda não temos evidências para responder essa questão.
Uma última observação é que, mesmo que reproduzir o conteúdo a 1,5 vezes a velocidade normal não afete o desempenho da memória, há evidências que sugerem que a experiência é menos agradável.
Isso pode afetar a motivação e a experiência das pessoas na hora de aprender coisas novas, o que poderia levá-las a encontrar mais desculpas para não fazê-las.
Por outro lado, a reprodução mais rápida se tornou popular, então talvez, uma vez que as pessoas se acostumem, não haja problema. Esperamos compreender melhor esses processos nos próximos anos.
*Marcus Pearce é professor de Ciências Cognitivas da Universidade Queen Mary, em Londres, Reino Unido.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).
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