Os dados desmontam a tese de que o FGTS estaria alimentando o ciclo de endividamento. Se há algo que realmente empurra o trabalhador para essa armadilha são as novas regras impostas pelo Conselho Curador, que restringem o crédito mais acessível do país e obrigam quem mais precisa a recorrer a alternativas muito mais onerosas. Quem antes podia antecipar o FGTS com juros de 1,79% ao mês será levado ao consignado privado, com taxas médias de 3,79%. Já os trabalhadores negativados, que representam 74% dos que utilizavam o saque-aniversário, terão como única opção o crédito fora da plataforma do governo, onde os juros ultrapassam 20% ao mês. Chamar isso de "proteção" é, no mínimo, um exercício de criatividade.
Estudos recentes indicam que as mudanças nas regras do saque-aniversário podem retirar mais de R$ 5 bilhões de circulação imediatamente, num momento em que as famílias de renda mais baixa enfrentam o maior nível de endividamento da última década. É um contrassenso: reduzir a liquidez de quem mais precisa de fôlego financeiro, justamente quando o país ainda tenta se reerguer dos efeitos de uma crise prolongada.
Em 2024, dados do Ministério do Trabalho e Emprego mostram que o FGTS totalizava R$ 770,4 bilhões, mantendo plena capacidade para seguir financiando programas habitacionais, investimentos públicos e a própria proteção ao trabalhador. O argumento de que o saque-aniversário compromete a sustentabilidade do fundo não se sustenta diante de seu desempenho sólido e contínuo.
O debate sobre o superendividamento é legítimo, mas precisa ser guiado por dados, e não por "percepções morais", ao gosto dos gestores de plantão, sobre como o trabalhador deve se comportar. Endividar-se para sobreviver é muito diferente de endividar-se por imprudência. O saque-aniversário surgiu justamente como uma alternativa racional e acessível a quem já estava preso em linhas de crédito abusivas.
O FGTS não é um favor do Estado. É um direito do trabalhador. Retirar dele a liberdade de usar o próprio dinheiro, em nome de uma suposta prudência fiscal, é confundir proteção com controle. O saque-aniversário não alimenta o superendividamento. Ele é, na verdade, o que ainda impede milhões de brasileiros de afundar nele.
*Henrique Lian é diretor-geral da Proteste/Euroconsumers-Brasil, doutor em filosofia pela USP e professor da FIA Business School

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